Você está pronto, José, para ver sua
mulher amar outro homem? Para ver seus gatos irem para a casa dele com ela, e ele
nem gostar tanto destes gatos que você trata melhor do que trata a sua avó?
Você está pronto para um dia ela encher o saco da bagunça
que você faz aqui na sua casa, da sua incapacidade de separar roupa branca da
colorida para lavar e ao mesmo tempo ter esse toc de não deixar a menina deitar
na sua cama com roupa da rua?
Porque eu estou de afirmando, José,
essa mulher vai te largar. Escute seu velho pai, coloca uns discos do Belchior
pra tocar para ela, aprende a cozinhar, come ela gostoso José. E não faz essa
cara pra mim, ou você acha que eu não transo com a minha mulher?
Eu posso não saber muita coisa da vida,
mas eu já chorei, já sofri, já achei que ia morrer de amor. E quando eu achei
que estava a salvo, foi ai que eu sofri de novo, porque quando a gente acha que
o amor está garantido no bolso, é aí que acaba, meu filho.
Não subestima o fim do amor, não acha
que amor é eterno ou a prova de tudo, aliás, também não subestima o passado que
o amor tem, somos todos sequelados de guerra, cheios de hematomas pelo corpo
destes amores que vem antes dos atuais. E isso deixa a gente diferente, meio
desconfiado da bonança, ou calado em dia de chuva lembrando daquele que veio antes.
Por isso se ela fica calada nos seus
braços, ou olhando para o nada, respeita o silêncio, respeita quem veio antes
de você e entende que todo mundo é construção de um amor, somos construídos por
nossos afetos e isso nos faz humanos, melhores como pessoas.
Só quem sofreu e ficou como um cachorro
magro de rua consegue amar de novo, pois quando se percebe que disso não se
morreu, a gente fica mais resistente e teima em gostar de novo.
Mas ao mesmo tempo isso também nos faz
mais fortes, mais resistentes, olho de lince na hora de perceber que está sendo
maltratado e dai ganha a mesma coragem de pular fora quando sabe que não está
bom.
Por isso eu estou te dizendo, José,
essa mulher vai te largar. Ou você se apruma e olha pra ela como se ela fosse
arte, ou eu vou ser o primeiro a dizer “muito bem” quando ela for embora.