Algumas músicas acabam comigo, algumas eu queria te mandar, mas acho que não posso.
Lembra aquela tarde dos discos? As horas que a gente passou entrando em todas as mini lojinhas daquela rua comprando tudo o que a gente gostava, “porque dinheiro é pra gastar com isso mesmo” e depois de sair de lá, bolsas cheias, bem menos grana e um vitrola meio velha no meu colo no ônibus, a gente ainda parou num bar.
Ninguém entendia a nossa lingua, a gente não entendia a
deles, mas de alguma forma você conseguiu fazer o dono do bar concordar em
ligar a vitrola e durante duas, três horas, a gente ouviu muitos dos nossos
discos como se ninguém estivesse perto, bebemos negronis, e teve uma hora que
você deitou a cabeça no meu colo e perguntou “porque a vida é tão complicada”.
Antes que eu te beijasse, você levantou.
Depois disso a gente andou até a minha casa e você subiu com
a vitrola e os discos enquanto eu guardava a bicicleta. Abri a porta e tinha
música de novo, e tem umas músicas que acabam comigo, você sabe, e você colocou
Al green, que covardia, colocar Al Green. Me esquivei para o banho. Você não me
beijaria. Me tiraria para dançar e não me beijaria e perguntaria porque a vida
é tão complicada enquanto respondia um e-mail dela sobre que tipo de marcenaria
vocês deveriam usar no quarto.
Saí do banho e você estava no sofa. Deitei no seu colo, você
mexeu nas minhas canetas, escolheu a merda de um marca textos e escreveu em mim.
Você lembra disso?
PLEASE HELP ME MEND MY BROKEN HEART. (E a frase ficou escrita
na minha lombar por três dias)
No dia seguinte você ia voltar para o Brasil e eu
continuaria minha jornada sabática por uns bons meses, sem ninguém.
A gente tinha essa mania engraçada de se encontrar pelo
mundo, mas no último ano você tinha decidido não me beijar, não me comer, só
que não entendia que ouvir meus discos, deitar no meu colo, escrever em mim e me
encontrar em outro continente era mais intimo do que sexo.
Era mais fácil se eu só sentasse em você, eu dizia.
A verdade é que você sempre soube. Era você. Desde o dia um
foi você, tudo o que veio depois foi tentativa de despistar meu coração de
você, você me movia.
E agora você diz que está disponível para mim.
Vejo a polaroid do marca textos na minha lombar. Alemanha
gelada, os discos, a vitrola quebrada que hoje serve de apoio para a planta da sala.
O quanto eu te queria, meu Deus.
E agora você pode.
"Pode"
Podia ter sido foda.
Mas virou literatura.
Foda!
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